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sábado, 23 de junho de 2012

Idade olímpica

Além do dia da noite da fogueira de São João, a folha indica que 23 de junho é o Dia Olímpico. Nesta data, em 1894, o Barão de Coubertin fundou o Comitê Olímpico Internacional e revigorou (ressuscitou, na verdade) a tradição dos Jogos pagãos da Grécia Antiga. Daquele 23 de junho em diante, a chama do ideal olímpico jamais se apartaria da humanidade, embora alguma vez ou outra o terror e a guerra tenham intentado apagá-la.

Por isso, hoje, 23 de junho, a 34 dias da Abertura dos Jogos Olímpicos de Londres, é dia para homenagear quatro atletas para quem o fogo sagrado de Olímpia ainda flameja elevado, sem se acomodar com os troféus e medalhas na estante nem se conformar com a passagem indescutível do tempo.


Quando começou a competir, a ginasta Oksana Chusovitina defendia a União Soviética. Em 1990, nos Jogos de Amizade (alguém aí se lembra dos Goodwill Games?), ela conquistou a medalha de ouro na prova do salto (quando ainda era "sobre o cavalo"). No ano seguinte, em Indianápolis, ela se tornou campeã mundial no solo e por equipes. Aí, a URSS acabou, as 15 repúblicas foram cada uma para um lado e, só para competir nos Jogos de Barcelona/92, 12 delas se reuniram sob o pavilhão olímpico e com a alcunha de Comunidade dos Estados Independentes (CEI).

Foi com a equipe da CEI que Chusovitina se tornou campeã olímpica. Nas três olimpíadas seguintes, ela representou seu país natal, o Uzbequistão, e não conquistou medalha alguma. Daí, ela se naturalizou alemã e, em Pequim, com 33 anos de idade, foi prata na prova do salto. Um feito grandioso para quem ainda só competia para pagar o tratamento médico do filho.

O menino, felizmente, já está curado da leucemia, mas a mãe ainda compete. E, no próximo fim de semana, ela vai disputar uma vaga na equipe alemã que vai para Londres. Num esporte em que juventude é fundamental, em que há uma idade mínima limite para disputa de campeonatos internacionais (16 anos), Oksana Chusovitina, aos 37, desdenha da ditadura do tempo e ainda é temida pelas rivais.

Ela não é a única que impõe medo, que quer ir a Londres e que não liga muito para idade.


Intitular sua história como "O Estranho Caso de Dara Torres" não seria ofensa à nadadora norte-americana, nem qualquer insinuação sobre doping, nada disso. Seria, apenas, reconhecer o espantoso rendimento que essa mulher tem nas piscinas, mesmo depois dos 40. Ou melhor, principalmente depois dos 40.

Dara conquistou uma medalha de ouro nos Jogos de Los Angeles, com 17 anos, no revezamento 4x100m livre, sem participar de nenhuma prova individual. Quatro anos mais tarde, em Seul, ela voltou para casa com duas outras medalhas, uma prata e um bronze, ambas em revezamentos. Na prova individual de que participou, os 100m livre, teve de se contentar com o sétimo lugar. Em Barcelona/92, já com 25 anos (idade com que Ian Thorpe, por exemplo, já havia anunciado aposentadoria), ela ajudou o revezamento dos EUA a ficar com o ouro no 4x100m livre. E houve um hiato.

Se não competiu em Atlanta/96, Dara Torres voltou à cena em Sydney/2000 e saiu da piscina com cinco medalhas - dois ouros em revezamentos e três bronzes em provas individuais - 50 e 100m livre e 100m borboleta. Ela era a nadadora mais velha da equipe norte-americana e foi a maior medalhista do time. E houve outro hiato.

Se estava velha para ir a Atenas, com 37 anos, estava em plena forma para nadar em Pequim, com 41. Se não conquistou medalhas de ouro - pois os revezamentos 4x100m livre e medley dos EUA ficaram com a prata -, por outro lado, voltou para casa com o melhor resultado individual de sua carreira olímpica. Superada em 0s01, Dara Torres foi segunda colocada na prova mais rápida da natação. E é nos 50m livre que ela, com 45, disputa no próximo dia primeiro a seletiva olímpica nacional.

Outra que, embora sem sucesso, tentou competir em Londres este ano foi a ciclista francesa Jennifer Longo. Ela pleiteava uma vaga no time nacional da prova de estrada do contra-relógio, mas o quinto lugar no campeonato francês frustrou sua expectativa, e ela não foi convocada para o selecionado olímpico. Teria sido sua oitava olimpíada consecutiva.

A francesa participou de todos os Jogos entre Los Angeles/84 e Pequim/2008. Em 1984 e 1988, a longa prova de estrada não trouxe medalha para Longo. A prata que conquistou em Barcelona/92, na mesma modalidade, não foi bem recebida por ela.

Por isso, quando Jeannie Longo venceu em Atlanta/1996, com 37 anos, depois de pedalar por mais de 100 Km e cruzar a linha de chegada 25s à frente da vice-campeã, diferença absurda no ciclismo, era de se imaginar que ali ela se aposentasse. Mas, não. Em Sydney/2000, ela foi medalhista de bronze no contra-relógio, foi décima colocada na disputa de estrada em Atenas/2004 e, incrívelmente, quarta em Pequim/2008 no contra-relógio.

Se a história de Jennifer Longo-Ciprelli não tivesse um exame positivo de doping em 1987 e uma suspeita recente de uso de EPO, sua carreira esportiva seria, sem dúvida, das mais bonitas. Ainda mais por ter tentado participar dos Jogos de Londres com quase 54 anos de idade.


Também cinquentona em atividade, e que também já teve problemas com um exame antidoping, é a velocista Merlene Ottey. Jamaicana naturalizada eslovena, Ottey vai disputar o campeonato europeu de atletismo na próxima semana, para tentar classificar o revezamento de sua nação adotiva para Londres. Se conseguir, será um feito quase tão extraordinário quanto as medalhas que já conquistou.

Em duas olimpíadas estigmatizadas por boicotes, Ottey saiu das pistas com três bronzes - dois nos 200m rasos em Moscou e Los Angeles, e um nos 100m, em 1984. Seul/1988 não rendeu pódio à jamaicana, mas, em Barcelona, a corrida de 200m rasos teve Ottey na terceira posição outra vez. Em Atlanta/1996, outro bronze (dessa vez, no 4x100m), mas com duas pratas em provas individuais - nos 100 e 200m rasos.

A medalha que lhe faltou nas Olimpíadas, ela só pôde conquistar em campeonatos mundiais. Foi campeã com o revezamento jamaicano do 4x100m em 1991 e foi bicampeã nos 200 em 1993 e 1995. Uma carreira irretocável, diga-se, não fosse uma polêmica em 1999.

Primeiro, foi anunciado que seu exame antidoping dera positivo, mesmo resultado da contra-prova. Ela foi suspensa, não participou do mundial de Sevilla. Entretanto, em 2000, às vésperas dos Jogos de Sydney, ela foi julgada e absolvida. Competiu nas Olimpíadas, tomando, inclusive, o lugar de uma companheira de time que obtivera resultados melhores que os seus na seletiva nacional, e ajudou o time jamaicano a ficar com a medalha de prata no 4x100m. Herdou, ainda, graças à eliminação de Marion Jones, por doping, um lugar no pódio dos 100m rasos - novamente, o terceiro posto. Mas já tinha 40 anos de idade e o ouro ausente nem fez muita falta.

Em Atenas/2004, ela já havia se naturalizado eslovena, mas não trouxe medalhas para sua casa nova, nem nos 100, nem nos 200m rasos. Agora, com 52 anos de idade, Merlene Ottey quer voltar ao cenário olímpico, tentando empurrar o improvável revezamento da Eslovênia.

Se Oksana Chusovitina, Dara Torres e Marlene Ottey estarão em Londres ou não, pouca importa. Elas - assim como Jennifer Longo, que já sabe que não vai - são prova de que medalhas não são o todo do esporte competitivo. Desafiar todo o tempo o próprio tempo é a competição mais dura. Competição que o movimento olímpico disputa há 118 anos, graças ao Barão de Coubertin, que não via razão para os antigos Jogos Olímpicos ficassem esquecidos por mais tempo.

(fotos: ffgym.com; facebook.com)

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